quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Portugal e a SIDA - Por Drª Maria José Campos


Diário de Notícias

*Filomena Naves 2007-11-21

Maria José Campos, GRUPO DE ACTIVISTAS VIH/SIDA.

"Falta uma política clara no combate à sida"**Como comenta o relatório de 2007 da ONUsida, que coloca Portugal no quarto pior lugar, quanto a novas infecções, na Europa Ocidental?

*Ainda não li o relatório completo. Do que vi, há uma comparação em termos de números absolutos, que não são comparáveis entre si. Por isso, tenho algumas dúvidas sobre esse quarto lugar.*Mas o panorama da doença é muito diferente do dos últimos anos em Portugal?*Não é muito diferente do que tem sido até agora. Mas há uma coisa em que é preciso voltar a insistir. O relatório baseia-se no número de casos notificados e isso, como se sabe, não representa a verdadeira realidade da infecção em Portugal. Ou seja, os dados do relatório representam sempre uma subavaliação do problema.


*Parece então que não se avançou muito em Portugal no combate à sida.

*Parece que não se avançou nada. E isso vem provar uma vez mais, por A mais B, que o problema não está resolvido em Portugal nas suas três vertentes fundamentais: a prevenção, o tratamento e a luta contra a discriminação. Só não vê isso quem não quer ver, ou está de má-fé.


*Como vê o caso recente do cozinheiro seropositivo que foi despedido por causa disso?

*É mais discriminação e um passo atrás no problema da sida. Há obviamente imensas pessoas a trabalhar na indústria hoteleira que são seropositivas e todos nós, com certeza, já todos comemos comida confeccionada em restaurantes por cozinheiros seropositivos, incluindo os juízes que julgaram o caso. E o que vai acontecer a partir daqui é que as pessoas nessa situação vão ter ainda mais relutância em falar do seu caso.


*O que está a correr mal para Portugal continuar com mau desempenho em relação à sida?

*Há uma ausência completa de uma política de cima para baixo, no sentido de colocar, de uma vez por todas, o problema na ordem do dia. Há muitos discursos, mas isso não chega.


*Falta o quê, concretamente?

*Falta tudo. Planear e pôr em prática uma política clara para combater a doença.


*Na prevenção, por exemplo?*

Fazê-la. Na educação sexual nas escolas, por exemplo, na política para grupos específicos, como os imigrantes que não falam português, ou os idosos, ou ainda os que vendem sexo na rua ou os que consomem droga. É tudo feito a conta-gotas.


*E no tratamento, o que não está a correr bem?

*As pessoas chegam demasiado tarde ao tratamento, ou não chegam. Neste momento, por razões economicistas, as administrações hospitalares estão a recusar aos doentes tratamento com medicamentos em ensaio clínico. O ministro da Saúde diz que não deu indicações de cortes orçamentais a esse nível, mas é que está a acontecer.

2007-11-21

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