domingo, 24 de outubro de 2010

Um portador de VIH é alguém que adquire características muito próprias.

Texto de uma amiga muito especial : http://positivopt.ning.com



Um portador de VIH é alguém que adquire características muito próprias. Por maiores que sejam as afinidades que possamos ter com um portador de VIH é necessário uma aproximação à causa, um debruçar sobre sentimentos e reacções para que possamos transmitir para o nosso mundo vivências que, pese embora as aproximações, nunca mais serão iguais às nossas.
O portador de VIH é duplamente magoado pela doença e pelo estigma. Torna-se hipersensível, mais inseguro e mais amedrontado. Por vezes receia a compreensão que vem de fora e que não entra no seu mundo inabitável para quem não pode entender, por não as sentir, as suas inseguranças e os seus medos. E também os seus anseios de vida agora mais agudizados pela ameaça e pela ansiedade com que preenche os dias.
A sua estrutura emocional é mais frágil, mais carente, os seus humores mais diversificados. As tempestades são longas entre os sóis que se põem e que voltam e onde ele se aquece por instantes para depois tremer de frio. A solidão é mais densa. Sente-se mais incompreendido. Recusa o que mais anseia. Porque a vida continua a pulular entre as suas desesperanças.
A estrutura nervosa/emocional está pronta a abanar ao menor sopro.Diz que está mais forte para se convencer que tem o que lhe falta. É preciso uma psicologia própria para deambular por este mundo e ganhar nele afecto e confiança.
Mas quando se consegue passar entre as malhas do medo, entre os nervos que abanam ao mais pequeno deslize, encontramos pessoas enriquecidas pelo sofrimento. Foram várias as que me disseram que o VIH as melhorou como seres humanos. Foram várias as que vi com uma nova noção do valor do tempo, com uma nova capacidade de entrega e com uma força interior para lutar. Lutar por si e pelos outros que é afinal a maior prova de luta que se pode travar.
O portador de VIH é efectivamente um herói, um ser de eleição, alguém que vale a pena conhecer e conquistar. Ele receia quem vem de fora. Quem pode não compreender que o mar tem muitas ondas e que há diferentes formas de as cortar.
O portador do VIH é ainda mais sensível se for portador doutro tipo de estigma. Aí torna-se ainda mais inseguro sobretudo se encontra uma mão estendida de quem nada tem destes estigmas que o arrasam e tornam as noites mais frias.
Ele tem medo do amor dos diferentes por muito que os diferentes se igualizem. Só os de condição igual falam a sua linguagem, lhe dão as suas certezas. Mas esses também são frágeis, também têm medo, também sofrem de ansiedades e humores ameaçados. Talvez os diferentes sejam a resposta se ele perder o medo. Afinal quem se aproxima já não é diferente. Vem de peito aberto sem medo de partilhar. E vem derrubar os estigmas na aproximação. E tem para dar a tal estrutura que o abana por vezes...
Um seropositivo tem muito para dar: tem a capacidade rica e criadora duma sensibilidade acrescida pela adversidade. Tem amor para dar a quem o ama. É melhor que a maioria das pessoas que não passou por isso. É um desafio e uma conquista no break even morte - vida.
Abram-se as portas a este crescimento humano sem medos. E todos seremos muito melhores. Porque afinal não somos diferentes. Do outro lado da barricada também há quem precise acreditar. Quem precise amar. Quem precise ser aceite.
Quem inventou o estigma devia estar bêbado. Quanto de luz se perde quando se constroem muros.